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STF: Gilmar Mendes nega vínculo de emprego a motorista de aplicativo

Published on: 2023/11/16
STF: Gilmar Mendes nega vínculo de emprego a motorista de aplicativo
O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), deu uma decisão que nega o vínculo de emprego a um motorista de aplicativo da Cabify — que encerrou suas operações no Brasil. Ele é o terceiro ministro da Corte que entende que não há relação de emprego nessa situação. Já existem decisões dos ministros Alexandre de Moraes e Luiz Fux, também a favor da Cabify.

Essas decisões do Supremo que cassam entendimentos da Justiça do Trabalho reconhecendo vínculo empregatício gerou insatisfação entre advogados, juízes, procuradores, acadêmicos e sindicalistas de todo o país. Na segunda-feira, um total de 64 entidades assinaram uma carta pública para os ministros. Defendem a competência constitucional da Justiça do Trabalho.

Gilmar Mendes cassou decisão do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais (TRT-MG). Ela reconhecia o vínculo de emprego, o que dava ao motorista o direito a verbas como FGTS, 13º salário e o terço de férias. Depois da condenação no TRT, a Cabify entrou com reclamação no STF dizendo que a decisão descumpre jurisprudência vinculante da Corte, que reconhece outras modalidades de trabalho não regidas pela CLT.

Na decisão, o ministro Gilmar Mendes assinala que, no julgamento sobre a licitude da terceirização (ADPF 324), ele já teria apontado que o órgão máximo da Justiça Trabalhista Especializada — o Tribunal Superior do Trabalho — “tem colocado sérios entraves a opções políticas chanceladas pelos poderes Executivo e pelo Legislativo”.

E que “ao fim e ao cabo, a engenharia social que a Justiça do Trabalho tem pretendido realizar não passa de uma tentativa inócua de frustrar a evolução dos meios de produção, os quais têm sido acompanhados por evoluções legislativas nessa matéria”, destaca.

O ministro ainda destacou em sua decisão que observa, no contexto global, uma ênfase na flexibilização das normas trabalhistas. “Com efeito, se a Constituição Federal não impõe um modelo específico de produção, não faz qualquer sentido manter as amarras de um modelo verticalizado, fordista, na contramão de um movimento global de descentralização.” (Rcl nº 63.414)

Por fim, destacou que o STF, já se manifestou no sentido de inexistir qualquer irregularidade na contratação de profissionais por meio de pessoas jurídicas ou sob a forma autônoma, a chamada “pejotização” para prestar serviços inerentes à atividade-fim da contratante, concluindo, assim, pela licitude da “terceirização” por “pejotização”.

O ministro Luiz Fux já se manifestou nesse mesmo sentido (Rcl 61267 e Rcl 59.404). O ministro Alexandre de Moraes também já deu decisões que negam o vínculo (Rcl 59.795 e Rcl 60.347). Todos os casos envolvem a Cabify.

De acordo com o advogado que assessora a Cabify nos processos, Daniel Chiode, do Chiode Minicucci Advogados, o Supremo vem assumindo protagonismo na definição dos parâmetros reguladores do trabalho por aplicativo, a partir de decisões da própria Corte, que já reconheciam esta modalidade como autônoma e não regulada pela CLT.

Ele ainda afirma que os grupos de trabalho existentes para criação de propostas que regulem o tema, com participação inclusive do governo federal, não foram capazes de encontrar consenso. “Exatamente por isto, o Supremo, dentro da sua competência, vem apontando as diretrizes das atividades profissionais por aplicativos. A série de decisões do STF revelam que a consolidação das leis do trabalho não se presta a regulação destas atividade”, diz.

Para o advogado que assessora motoristas de aplicativos, José Eymard Loguercio, do LBS Advogados, não seria o caso de julgar esse tema por reclamação. Ele também destaca que o STF não analisou o assunto em repercussão geral, para que seja vinculante. E diz que esses casos não tratam de terceirização, nem da situação específica de motoristas autônomos — que têm legislação própria.

Por fim, Loguercio destaca que o então procurador-geral da República, Augusto Aras, até pediu no STF para que seja uniformizada a jurisprudência sobre reclamações quando a Justiça do Trabalho identificar fraude à caracterização do vínculo empregatício (Rcl 60620).

Segundo Aras, é inadmissível o uso de reclamações nesses processos porque as teses fixadas no julgamento sobre terceirização não tratam da mesma situação. Ainda de acordo com ele, entre 2019 e junho de 2023, mais de 780 mil casos envolvendo pedidos de reconhecimento de vínculo chegaram à Justiça especializada, o que demonstraria a repercussão social do tema.

Além das reclamações, já existe recurso da Uber para ser analisado no Pleno do Supremo. Ele foi distribuído para o ministro Edson Fachin, mas ainda não há data para o julgamento (RE 1446336).

Os aplicativos têm levado a melhor nessas ações. Levantamento realizado por meio da plataforma de jurimetria Data Lawyer mostra que há 15.221 processos (finalizados) contra Uber, 99 e Cabify e 5.555 decisões favoráveis aos aplicativos (pode haver mais de uma por ação). Aos trabalhadores, há 2.388 vitórias.

No Tribunal Superior do Trabalho (TST), as 2ª, 3ª, 6ª e 8ª Turmas decidem pelo reconhecimento de vínculo, enquanto as 1ª, 4ª e 5ª Turmas negam os pedidos. Na Subseção I Especializada em Dissídios Individuais, que consolida o entendimento do TST, dois processos contra a Uber estão sob análise (E-RR-1000123-89.2017.5.02.0038 e E-RR-100353-02.2017.5.01.0066).

Artigo originalmente publicado no dia 14 de novembro de 2023 no site do Valor Econômico.
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